Por Matheus
Piovesana
São Paulo, 02/06/2021 - O marco
legal das startups, sancionado nesta quarta-feira, 1º, pelo presidente Jair
Bolsonaro, deixa um saldo positivo para o setor, mas mantém em aberto temas
importantes para o ecossistema brasileiro de empresas inovadoras, de acordo com
especialistas consultados pelo Broadcast. Para eles, o veto a artigos que davam
incentivo tributário a investimentos em startups tende a concentrar aportes em
empresas maiores. No lado positivo, a simplificação da entrada dessas empresas
em licitações do Poder Público é vista como um legado benéfico para ambas as
partes.
Bolsonaro fez dois vetos à lei.
Um dos trechos permitia que investidores pessoas físicas compensassem no
imposto sobre ganhos de capital possíveis prejuízos com investimentos em
startups. O outro demandava da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) a criação
de regras mais brandas para que essas empresas acessassem o mercado de
capitais.
Os dois mecanismos, na leitura de
analistas, facilitariam o desenvolvimento de startups desde o estágio inicial,
quando o risco mais alto de que os negócios deem errado espanta muitos
investidores.
"O investimento em startups
cresce muito no Brasil, mas está concentrado em poucas grandes empresas. É um
investimento de maior risco com tributação elevada", diz Felipe Matos,
presidente da Associação Brasileira das Startups (Abstartups). Segundo ele, a
tributação a esses aportes é desfavorável na comparação com a que incide sobre
ganhos com títulos de renda fixa, como letras de crédito agrícola ou
imobiliário (LCAs e LCIs), por exemplo, problema que o veto ao texto manteve.
A eliminação da criação de um
arcabouço de regras mais simples para que as startups acessassem o mercado de
capitais, por sua vez, mantém a dificuldade de que empresas em estágio inicial
cheguem à Bolsa, dadas as pesadas exigências da Lei das Sociedades Anônimas.
"Isso traz um dificultador. Sabemos que o mercado de capitais movimenta
muito investimento, e o veto dificulta o andamento de ofertas", diz Thiago
do Val, professor da pós-graduação em relações institucionais e governamentais
do Mackenzie Brasília.
Em relação à Lei das S.A.s,
porém, os especialistas veem avanços importantes na desobrigação da publicação
de balanços das empresas fechadas em jornais impressos de grande circulação e
na possibilidade de que o livro societário seja digital, e não físico.
Por outro lado, há omissões.
Ficaram de fora do texto a possibilidade de que Sociedades Anônimas se
enquadrem no Simples e a regulamentação da tributação das stock options,
forma de compensação aos funcionários que, a depender do entendimento jurídico,
pode ser considerada uma remuneração ou uma operação mercantil, com cobranças
diferentes de impostos.
Fomento estatal
A mudança mais positiva trazida
pelo texto, segundo os analistas, diz respeito à contratação de startups por
entes públicos. O marco legal simplifica regras para que essas empresas
participem de licitações, e permite que o Estado busque soluções inovadoras nas
startups, mesmo que essas soluções ainda não existam. É uma lógica diferente da
empregada pela lei de licitações, que busca fornecedores consolidados, com
produtos prontos, para evitar desperdício de dinheiro público.
Para os analistas, a alteração
ajuda no desenvolvimento de startups com boas ideias, mas que não tenham
conseguido acesso a financiamento na iniciativa privada. "As startups
dependiam só do investimento privado. Este ponto dá mais amplitude", diz
do Val, do Mackenzie.
A ideia é de que a relação seja
benéfica para os dois lados. "Imagina uma startup com uma boa ideia e que
precisa de dinheiro para desenvolvê-la? Ela ganha escala, competitividade, e o
Estado ganha a possibilidade de usar essa ideia", afirma Eduardo Felipe
Matias, sócio do escritório NELM Advogados.
Além disso, o marco legal permite
a criação de ambientes regulatórios experimentais, os chamados sandboxes, para
que as empresas desenvolvam soluções sem preocupar-se com a regulação - muitas
vezes voltada para o passado.
Matos, da Abstartups, lembra que
as fintechs e empresas como a Uber criaram soluções que infringiam ou testavam
os limites de leis anteriores, mas que com o tempo, a lei se adaptou a elas. Um
sandbox poderia tornar essa adaptação mais rápida. "Diversos países têm
criado espaços em que as startups podem existir e inovar de forma excepcional
ao sistema", completa.
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Notícia originalmente do Estadão.
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