Novo rumos da agenda
climática trazem oportunidades para o Brasil
Por Andrea Vialli
O ano de 2021 promete acelerar a
agenda socioambiental no mundo todo: a posse do democrata Joe Biden, que trouxe
a tiracolo o retorno dos Estados Unidos ao Acordo de Paris e um plano de
recuperação da economia americana que prevê US$ 2 trilhões para financiar
atividades de baixo carbono, já coloca as discussões sobre sustentabilidade em
um novo patamar. Aliado a isso, a comunidade de investidores segue apostando na
importância dos fatores ambientais, sociais e de governança (ESG, na sigla em
inglês) para o direcionamento dos recursos.
Em janeiro, a tradicional carta
ao mercado de Larry Fink, CEO da gestora de ativos BlackRock, instou empresas a
apresentarem planos específicos de alinhamento de seus negócios a uma economia
neutra em carbono até 2050. A Europa, que tem um plano de recuperação de € 750
bilhões também com foco na retomada verde, está cada vez mais propensa a adotar
acordos comerciais e fazer negócios com lastro em sustentabilidade. Em
novembro, a COP-26, a conferência das Nações Unidas sobre clima, que será
realizada em Glasgow, na Escócia, deverá ditar os rumos que a agenda climática
deve seguir nos próximos anos.
Trata-se de uma sinalização clara
para os negócios. O cerco está fechando para práticas não sustentáveis, e o
Brasil tem amplas oportunidades nesse cenário, por ser um país abundante em
recursos naturais, com matriz energética considerada limpa, além de deter
florestas e biodiversidade que permitem gerar serviços ecossistêmicos. É
preciso, porém, alinhar políticas públicas e o setor privado em um plano comum
que permita ao país sinalizar ao mundo, com clareza, que está disposto a surfar
nas grandes ondas da transição para a economia de baixo carbono.
“O Brasil tem dois caminhos: ou
fica ativo nessas questões, ou fica reativo. Temos legitimidade em uma economia
mais limpa e muitas vantagens nessa corrida, mas antes é preciso pacificar
questões importantes para fortalecer a narrativa”, diz Marina Grossi,
presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento
Sustentável (CEBDS), que reúne mais de 60 grupos empresariais.
Entre as questões prioritárias a
serem resolvidas, está a insegurança jurídica em relação à regularização
fundiária e combate ao desmatamento, que responde por mais de 40% das emissões
de gases de efeito estufa no Brasil e cujas taxas aceleram nos últimos dois
anos. Se o ritmo de desmatar 9.178 km2 de floresta amazônica por ano se
mantiver, como foi registrado em 2019, algumas das metas assumidas no âmbito do
Acordo de Paris não serão cumpridas.
Marcello Brito, representante da
Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, tem a mesma opinião. “O
desmatamento ilegal é nossa mácula, o problema maior que afeta a imagem do
Brasil”, afirma. A Coalizão representa mais de 200 empresas e associações
ligadas ao agronegócio e setor florestal entre outras, e atua em favor de
aumentar a produtividade dos setores com base em boas práticas sociais e
ambientais e na interlocução com governo e instituições.
Para Brito, que também preside a
Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), o Brasil avançou em modernizar o
Código Florestal em 2012, mas sua implementação tem sido muito lenta. “Estamos
no terceiro governo desde que a lei foi aprovada e continuamos com problemas de
compliance, que não nos dá a segurança necessária para conclamar ao mundo que o
Brasil está fazendo sua parte para combater o desmatamento ilegal”, diz Brito.
O agronegócio deve seguir como um
dos setores mais pressionados, tanto pela dependência da transformação do uso
da terra para a produção de riquezas, tanto pela competitividade inerente ao
Brasil: está na linha de frente das pressões envolvendo acordos comerciais,
como o da União Europeia e Mercosul, e também está radar de Joe Biden, que já sinalizou
o interesse em colaborar com a preservação da Amazônia com a cifra de US$ 20
bilhões.
“O Brasil, se quiser aumentar o
comércio com os EUA por meio de novos acordos de livre comércio, precisará
estar atento a cláusulas de respeito ao meio ambiente, assim como no acordo
União Europeia e Mercosul”, explica Eduardo Felipe Matias, doutor em direito
internacional e autor do livro “A Humanidade contra as cordas”, sobre relações
internacionais e sustentabilidade.
Embora essas exigências possam
mascarar intenções protecionistas, a ascensão de Biden à Casa Branca colocou a
questão ambiental no cerne da política externa, de segurança nacional e da
retomada econômica dos EUA. Biden, que deve apresentar uma nova NDC
(contribuição nacionalmente determinada) na Cúpula dos Líderes sobre o Clima no
Dia da Terra, evento previsto para abril, já sinalizou com o compromisso de
zerar as emissões líquidas de gases de efeito estufa até 2050.
No campo dos investimentos, a
agenda ESG vem ganhando corpo nos últimos anos e acabou acelerada pela pandemia
de covid-19. Em 2021, a tendência é que siga em alta: foi um dos temas mais
abordados durante o Fórum Econômico Mundial, no fim de janeiro, e está presente
na Pesquisa de Percepção de Riscos Globais, que todos os anos é apresentada no
evento. Na edição de 2021, os eventos climáticos extremos são uma ameaça de
curto prazo para 52,7% dos respondentes; já a crise dos recursos naturais é
vista como preocupante no longo prazo por 43,9%.
“O ESG ficou muito em evidência,
mas está longe de ser um conceito novo. O que se vem se materializando é um
avanço nas informações disponíveis sobre esses aspectos e uma visão clara, por
parte dos investidores, que se trata de gestão e mitigação de riscos”, diz
Carolina da Costa, especialista em ESG da gestora Mauá Capital e professora do
Insper. A gestora tem sido muito procurada por empresas interessadas em
utilizar o mercado de capitais para acessar investimentos para aprimorar sua
gestão socioambiental - são de setores como mineração e petroquímica que também
buscam levar os padrões ESG para suas cadeias de valor.
Outro termômetro da evolução da
temática ESG no Brasil e na América Latina é a adesão ao CDP (Carbon Disclosure
Project), organização global sem fins lucrativos que tem como objetivo
estimular a transparência das empresas nas questões de clima, recursos hídricos
e florestas. Para isso, conta com a adesão de investidores institucionais
signatários, que questionam as empresas listadas nas principais bolsas de
valores do mundo.
Em 20 anos, o CDP saltou de 35
investidores signatários para 525, que possuem, juntos, US$ 95 trilhões em
ativos sob gestão. A adesão das companhias ao reporte ambiental também cresceu
exponencialmente: de 245 para mais de 8.500, sendo mais de 1.000 na América
Latina. O CDP também mapeia o total que as companhias investem para redução das
emissões de gases de efeito estufa. A cifra triplicou nos últimos quatro anos,
saltando de US$ 2,1 bilhão em 2016 para US$ 6,3 bilhão em 2019, só na América
Latina.
“O movimento é nítido e crescente, e as empresas do Brasil serão mais cobradas pelos seus stakeholders, sejam investidores solicitando informações ESG, ou consumidores buscando processos produtivos que conservem florestas e direitos humanos”, diz Gustavo Souza, gerente de políticas públicas do CDP América Latina.
A matéria foi originalmente publicada no Valor Econômico.
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